sexta-feira, 22 de agosto de 2008

teia

O que fazer quando a vida está tão enredada como aquele jogo infantil que fazíamos entre uma e outra mão com um fio de lã e que chegado ao terceiro ou quarto passo não apresentava já solução possível? Na impaciência e optimismo de crianças, depressa largávamos o fio e nos lançávamos com renovado entusiasmo a outra brincadeira. Enterrar bichos-de-conta em caixas de fósforos, por exemplo. Com direito a velório e lágrimas de teatrinho e tudo. Os enredos da vida adulta são mais intrincados. Nem sempre tenho à mão um fio para relembrar o jogo, ao jeito de exercício de paciência, não gosto de insectos de qualquer espécie, mesmo que seja para enterrá-los vivos, e o velório da minha vida acompanhar-me-á até à morte. Já as lágrimas de hoje são verdadeiras. Pois é: tudo é mais difícil e agora é mesmo a doer. No entanto, por entre a teia que sinto ter descido perfidamente sobre mim nos últimos dias, e que me tem tolhido os movimentos e toldado a razão, houve duas tábuas de salvação a assinalar: 1) tomei uma decisão (pasmai: uma!) que não enuncio por pudor; e 2) abri um pouco o reposteiro pesado por trás do qual se escondem sentimentos que tenho guardado como objectos inúteis num sotão empoeirado. Da mesma forma que se descobre que esses objectos podem ganhar nova vida por se revelarem essenciais ou por voltarem a estar na moda, redescobri um sentimento puro e quase intocado, apesar dos tombos e tropeções que, coitado, vem sofrendo. Recuperei-o, limpei-o bem limpinho, fiz-lhe o embrulho mais festivo de que fui capaz e como uma carochinha espero à janela que passe a pessoa a quem possa oferecê-lo por saber que o tratará como verdadeira preciosidade. Bónus para o náufrago: continua a haver um copo para beber.

bso The jeweller by This Mortal Coil

Nenhum comentário: